Foi o menos tradicional dos presentes de Natal. Não se
compra em loja, não se encontra em shopping, não se concorre a prêmios com a
nota fiscal. Discreto por natureza, não veio com um grande laçarote, como viria
um carro zero quilômetro, um filhote de cachorro, ou outro desses presentes que
gostam de causar impacto. Não vale fortuna. Não tem marca. Não cabe em nenhum
embrulho. O presente que ganhamos da minha mãe foi uma pequena árvore. Não uma
árvore de Natal, uma planta mesmo, para colocar na varanda. Batizamos de
“Matinho da Vila”. E desde que chegou, a casa nunca mais foi igual.
Matinho da Vila é um bambu-mossô, espécie de planta da qual
eu nunca tinha ouvido falar. Verde, torto, cheio de folhas, pela cara se vê que
é japonês, chinês ou qualquer outro “ês” de olho puxado, e que deve ter nascido
no meio de um jardim zen com propriedades místicas e transcendentais. Curioso a
respeito do novo habitante da minha casa, fui então consultar a enciclopédia
dos ansiosos, a internet, e me dei
por satisfeito com uma pesquisa pouco acadêmica em três sites de credibilidade não verificada.
O primeiro site apresentava
a versão sustentável, porém um tanto estranha, do novo ser que divide a varanda
comigo. Feito com restos de um bambu morto, a planta fica no meio do caminho
entre natural e artificial, criando um efeito estético bastante similar ao
exemplar vivo, porém sem precisar de luz do sol, podas ou regas. Prático, mas mórbido.
Para o mundo verde, a fábrica deve parecer um Madame Tussauds do mal. É como
fazer uma estátua com os próprios ossos do defunto. E que me desculpem os donos
de loja de shopping e de escritórios, mas se não quer regar, não pode ter
planta. Ou então tem que comprar um cacto. Por precaução, não mencionei nada a
respeito da minha descoberta em locais perto da varanda. Vai que Matinho da
Vila resolve parar de fazer a fotossíntese, em protesto. O suicídio
de uma árvore daquelas seria uma grande perda, não só para a natureza, mas
principalmente para os meus domingos na rede.
O segundo site
trouxe informações igualmente preocupantes. Pois saibam vocês que o bambu-mossô,
o último dos românticos, que floresce somente uma vez a cada 67 anos e que,
depois de florescer, geralmente morre por ter gastado toda a sua energia na
reprodução (discípulos de Wando, façam reverência), não é naturalmente torto. Isso
mesmo. Em outras palavras, se o seu bambu-mossô tem o caule torto, foi torcido
por mãos humanas, em um processo de realizado logo nos seus primeiros anos de
vida, para que fique mais bonito. De fato, fica legal, mas tenho certeza que
Matinho da Vila não optaria por tão dolorosa cirurgia estética nem mesmo que
fosse feita por Ivo Pitangui. Agora o mal está feito. Como disse o É o Tchan,
“pau que nasce torto nunca se endireita”. Mas Matinho da Vila nasceu reto, que
fique registrado.
O terceiro site,
este sim, finalmente atendeu às minhas expectativas. Com um visual
absolutamente constrangedor de coisas esotéricas, trazia uma matéria sobre o
significado das plantas. E sem as divagações típicas destes textos de pouco
conteúdo, dizia que a espécie bambu-mossô é “ótima para aquietar a mente”. E
isso eu posso atestar. Não tem uma tarde que o Antonio não capota na rede logo
embaixo da árvore. Não tem uma noite que eu não queira simplesmente ficar ali,
admirando a vista, vendo o tempo passar. Não tem um dia que não eu pense: não
vou fechar esta varanda. Finjo que é pela vista, que quase não há. Finjo que é
pelo vento, que entraria de qualquer forma. Mas sei que é para ter um simulacro
de quintal no apartamento. Um lugar tranquilo, com uma árvore e uma rede, para
não se fazer nada. Só para parar e respirar.
Obrigado, mãe, pelo menos tradicional dos presentes de
Natal. Matinho da Vila nos faz muito boa companhia. Escuta em silêncio. Faz
barulhos com o vento. Às vezes parece que sorri. Só falta cantar.
Feliz Natal a todos.
Feliz Natal pra vc e sua família. Um beijo
ResponderExcluirPara vc também. Um beijo
ExcluirUfa!
ResponderExcluirQue inesquecível agradecimento. É. A felicidade está nas coisas simples, perto de nós. Muitas vezes escancaradas perto de nós e não nos damos por conta.
Este belo Matinho da Vila será o cenário, já é, de muitos bons momentos desta bonita, nova, essencial e guerreira família que é a de vocês.
Beijos.
Beijos
ExcluirFeliz Natal Fabio, Ana e Antonio. Que o Ano Novo traga muitas alegrias para vocês. Bjos, Monica Leite
ResponderExcluirObrigado, Monica. Para vc também.
ExcluirNota-se que tal presente significativo só poderia vir de alguém muito sensível como Neiva, a quem adotei como "vó".
ResponderExcluirFábio, conhecer pessoalmente vc, Ana, Tom Tom e Nanda foi um dos presentões que 2012 me deu. Que 2013 seja iluminado a todos vcs! Muita saúde e fé sempre!
Beijo grande.
Adoramos te conhecer também Ká. Que você faça um 2013 sensacional também, com muita saúde. Grande beijo
ExcluirCara, a naturalidade que você escreve é uma coisa orgulhosa de se ver/ler/gostar e quantas outras barras sejam necessária pra expressar esse meu pequeno ponto de vista.
ResponderExcluirEssa coisa de transportar algo que marcou a sua infância para o universo natural, com referências enriquecedoras e comentários plenamente plausíveis certamente lhe credenciam a escrever sobre o mais entediante dos assuntos sem que tal morbidez seja percebida.
Eu leio esse post bem depois do Natal e me arrependo por não ter visualizado na data em questão. Eu teria pensado diferente sobre algumas pequenas coisas.
Parabéns Fábio. Você tem estilo.