Neste final de semana estávamos passeando com o Antonio no
carrinho, no shopping, quando um menino de mais ou menos 7 anos passa pela
gente e grita:
- Mãe, você viu que bebê estranho?
Não olhei para trás. Não queria deixar a mãe, que provavelmente
estava procurando algum lugar para se esconder, ainda mais constrangida. Na
verdade, até ri por dentro, certo de que não havia maldade na surpresa do
menino. Acho a espontaneidade das crianças engraçada. Porém, por mais que eu
tente raciocinar, por mais que minha alma compreenda o que aconteceu, é preciso
admitir: doeu.
A incapacidade infantil de interpretar códigos sociais é ao
mesmo tempo uma dádiva e uma cruz. Quando pequenos, somos admirados por
nossa inocência, nossa pureza, e, não raro, quando adultos, lamentamos ter
perdido qualidades tão valorosas. Entretanto, também somos inúmeras vezes
repreendidos por expressarmos estas mesmas características em forma de
perguntas constrangedoras, comentários inconvenientes ou simplesmente em preguiça
de pedir licença, lavar as mãos ou agradecer.
Não faltam papagaios repetindo que a infância é a melhor
época da vida. Será mesmo? Para quem tem o ímpeto de ser dono do próprio nariz,
os primeiros anos podem se tornar um verdadeiro martírio. Uma época em que não
se tem livre arbítrio, talvez o bem mais desejado pelo ser humano. Um tempo em
que pais, avós ou professores, infelizmente nem sempre movidos pelos melhores
motivos, porém sempre garantindo que é para o “seu bem”, tomam decisões por
você. Sim, há vantagens em não ter que se preocupar com nada. Há a espera
inesquecível pela fada do dente, pelo coelho da Páscoa e pelos presentes
embaixo da árvore de Natal. Porém, em pouco tempo tudo isto cansa. E entra em
jogo uma espera ainda mais insuportável, normalmente creditada aos litros de
hormônios que inundam nosso corpo na adolescência, mas que psicologicamente não
é nada mais nada menos do que a agonizante espera por crescer.
O garoto que estranhou o Antonio não quis nos ofender. Ele
está na idade em que o mundo para de fazer sentido. A mente fica tomada de por
quês. Ver um bebê como o meu filho pela primeira vez foi só mais uma peça
difícil no quebra-cabeça do garoto. Espero, sinceramente, que a mãe dele use a
situação para explicar algo novo ao filho. Que ela inclua a aceitação das
diferenças no rol de valores que formarão o caráter deste menino.
Fábio,
ResponderExcluiracho que sua preocupação nesse caso é, mais uma vez, com Antonio. talvez vc tenha pensado em como ele poderá reagir a episódios como esse, quando ele estiver maior. os pais sempre tentamos evitar que nossos filhos sofram e nos faz mal pensar que eles estarão, um dia, expostos ao mundo, sem nós como "filtros".
força!
Rita, você tem razão: minha preocupação é com ele. Volta e meia me pego pensando se ele algum dia terá consciência de sua diferença. Alguns sindrômicos de Down têm essa noção. E me parece saudável. Um dia ainda escrevo sobre isto. bj
ResponderExcluirFábio, a gente até tenta, mas é impossível sermos fortes em tempo integral, afinal não somos super heróis. Outro dia coloquei uma foto no Facebook que dizia: "Se eu me importo com coisas bobas, é porque elas tem um significado para mim". E é assim mesmo que eu penso. Por isso mesmo acho que você tem todo o direito de dizer: "doeu"!!! Bjs
ResponderExcluirFábio, dizer que não dói ouvir certas coisas, principalmente, qd se trata de alguma coisa com nossos filhos, é bem difícil, bem complicado mesmo.Por outro lado pense que se seu filhote é diferente, é pq ele é especial e se está com vc, deve ter uma razão muito forte que se vc ainda não entendeu, um dia vai entender, pq Deus sabe o que faz.
ResponderExcluirEspero, que esse episódio sirva, para o garoto que na santa inocência dos seus 7 anos,aprenda, através da sua mãe, as diferenças que existem nessa vida, não só em termos de pessoas, mas em td e qq sentido.
Bj grande
Fábio, adoro os seus textos!
ResponderExcluirMuito obrigada!
Manda um beijo pra Ana, companheira de Keep Cooler da adolescência, e outro pro Antonio.
Valentina
Fábio,
ResponderExcluirTambém espero que a mãe faça interferências quanto a formação de valores como respeito e convívio com as diferenças...
Só quem tem o convívio com os diferentes é que sabe o valor que estes vínculos nos proporcionam.
Este sentimento de proteção para com o Antônio é de fato papel de pais preocupados com a formação humana íntegra.
Abraço na família.
"Doeu"... Eu sei como é esse "doeu"... É uma dor fina, pujante, persistente, incômoda, que fica martelando lá no nosso coração mesmo que a gente faça um esforço monstro pra não deixar que isso aconteça..
ResponderExcluirDoeu porque vc é pai, porque vc quer que seu filho não tenha que atravessar nada de ruim que a vida nos obriga enfrentar, doeu porque o mundo pode ser tão cruel e pra nós, pais, filho é a coisa mais preciosa que tem no mundo e que não merece nenhum tipo de sofrimento. (mesmo que isso seja um completo absurdo, mas é fato! *_*)
Doeu porque vc sabe que o Antonio é muito melhor que uma aparência, que é muito melhor do que qualquer um pode imaginar, e muitos não se permitem ver isso. Ver a beleza desse menino que te faz ser uma pessoa melhor a cada dia..
Doeu simplesmente porque vc o ama mais que a si mesmo e tem dentro de você aquele instinto de proteção que ninguém consegue explicar até que tenha um filho, especial ou não.
Doeu, porque nós, pais, não gostamos dessa coisa de desconhecido e quase sempre nos sentimos ameaçados e tementes que não possamos fazer o melhor.
Doeu porque vc sabe que mais dia, menos dia o Antonio vai enfrentar esse tipo de "colocação" e que isso não vai partir de uma criança. E vc não sabe qual será a reação dele..
Ou seja, Fábio, doeu simplesmente porque vc é pai.
Bjos no seu coração.. E na bochecha do Antonio.
Fala, Fabião! Não sei se você visualiza uma frase que nós, leitores do blog, vemos acima daquelas palavras engraçadas que a gente tem de digitar para validar o comentário. A frase é: "Prove que você não é um robô". Eu hoje digitei "hembei ghergy" e postei este parágrafo. Você teve um arranhão besta no shopping. Ab, meu velho! Da Vila
ResponderExcluirFábio,
ResponderExcluirA realidade não deve doer. Não se pode viver na ilusão. Ele é sim um bebê diferente, mas isso não significa ser errado. Talvez, no futuro, ele seja mais esperto ou mais carinhoso, ou menos perceptivo dos defeitos, ou mais calmo e condescendente com diferenças do que este menino de 7 anos. O que o menino disse é real. Ele percebeu uma diferença. Só isso. E daí ? As diferenças são sim perceptíveis. E daí ? Daí "morreu neves"! A vida continua. A luta continua. O amor continua. Nada assegura àquele menino que ele não possa mudar, ser diferente, não ser igual aos outros. Seria diferente, não ? Não importa se ele nasceu ou não de uma forma ou de outra. Temos que lidar com a vulnerabilidade de tudo.
Sofrer, arranhar-se, esfolar-se, chorar quieto a nossa dor faz parte da vida. E como faz.
Mas a gente vai para a cama, descansa,acorda no outro dia, percebe o sol, o bom café da manhã esperando a gente, o trabalho para sobreviver e que a gente gosta, e a vida para prosseguir com diferenças e sem diferenças. Prefiro a vida com diferenças. Tem menos tédio.
Beijos
Mãe
Fábio, estranha é a vida de todos nós. Estranha será a vida desse garoto de sete anos que fez o comentário inocente se a sua mãe não mostrar a ele, no tempo oportuno, os valores que o tornem um ser humano digno. Sei que é dificil ouvir isso e não sentir dor, dor no orgulho de pai, como você diz, mas lembre que a "estranheza" do Antonio tem sido o maior e melhor aprendizado para todos nós. Graças a ele, temos nos tornado um pouco menos "estranhos" a cada dia; graças a ele, temos encontrado uma maneira de nos tornarmos melhores como pessoas. Um beijo grande e saudoso, especialmente no Antonio.
ResponderExcluirMimi
Fábio, meu kerido!
ResponderExcluirEsse seu blog é uma coleção de pérolas. Jóia rara sua capacidade de transmitir o que sente com tanta emoção (não canso de dizer isso). Acredite: admitir que doeu ter ouvido isso, te ajudará a (um dia) ensinar ao Antonio a lidar bem com esse tipo de "estranhamento". Estranho mesmo seria se vc não reconhecesse o arranhão... vc sabe, feridas mal cuidadas infeccionam e depois nos perturbam muito mais.
Até mais, Família Ludwig.
Beijos.
"Miguilim, Miguilim, vou ensinar o que agorinha eu sei, demais: é que a gente pode ficar sempre alegre, alegre, mesmo com toda coisa ruim que acontece acontecendo. A gente deve de poder ficar então mais alegre, mais alegre, por dentro! " João Guimarães Rosa.
ResponderExcluirPois é, Fábio, o ruim é passar por essas situações, mas, a alegria de poder ver todo o despertar do Antonio é algo incomparável, como você já nos disse tantas vêzes. O crescimento de vocês, e o nosso, que os acompanhamos, é incomparável. Obrigado a você por me transmitir tanto amor, tanta superação, tanta lucidez, tanta sensibilidade. Continuarei crescendo com você. Bjos, Mônica Leite
Cléo, obrigado. Um bj
ResponderExcluirSonia, como vc disse: há uma razão muito forte. E todos em volta do Antonio já começaram a entender. Ele já mudou o mundo em volta dele. bj
ResponderExcluirValentina, obrigado. Bj mandado. Outro pra vc.
ResponderExcluirRejane, antes do Antonio, havia convivido pouco com diferenças. É uma experiência engrandecedora que todos, de alguma maneira, deveriam ter. Bj
ResponderExcluirPolly, obrigado pelo belo comentário, pela divulgação, pelos elogios. Me deixam lisonjeado. E o Antonio é muito mais do que a aparência sim. Se bem que eu acho ele lindão por fora tb. rs. bjao
ResponderExcluirDa Vila, uma amiga, Ká, comentou ali embaixo. A ferida mal cuidada infecciona. A bem cuidada cura. O arranhão besta já já vai desaparecer. Abraço
ResponderExcluirMãe, também prefiro a vida com diferenças. Longe de mim ter desejado uma síndrome como a do Antonio. Mas já que a vida trouxe, vamos descobrir o que essa situação diferente tem para oferecer. bj
ResponderExcluirDinda, a estranheza do Antonio tem sido mesmo o nosso maior aprendizado. Queria tanto que vocês pudessem acompanhar mais de perto cada passo que ele tem dado. Aprende a cada dia. Incrível de ver. Bj. saudades.
ResponderExcluirKá, cada comentário seu é um aprendizado enorme para mim tb. Um bjao
ResponderExcluirMônica, um comentário com Guimarães Rosa já é bonito por si só. Obrigado a você por voltar sempre por aqui, deixar sempre uma palavra tb cheia de sentimento. Um bj
ResponderExcluirAcabo de conhecer seu blog, por causa de um comentário da Ka no Facebook. Sou cadeirante, conheço esse tipo de dor. Seu texto me comoveu até a raiz dos cabelos. Vc vai curando suas dores e nos ajudando a curar as nossas. Abraço carinhoso!
ResponderExcluirLaura, obrigado. É bom ter leitores que se identificam com o que falo. Bj
ResponderExcluirOlá Fábio!! O meu filho também tem 7 anos e vez por outra me questiona sobre tantas coisas... A espontaneidade e curiosidade das crianças, principalmente nessa idade é algo surpreendente! Muitas vezes esses questionamentos se tornam infelizes se pensarmos como adultos, mas um pouco mais aceitáveis se pensarmos como eles.
ResponderExcluirNa cabeça dessa criança, ao ver o Antonio, passou algo tão simples quanto a afirmação: Ele é diferente! E o que temos que levar em consideração é que realmente o Antonio é diferente. É diferente porque tem uma parte do cromossomo diferente, é diferente porque transformou a vida de você e da Ana, é diferente porque te fez pensar no desenvolvimento do seu filho de uma forma muito mais intensa do que qualquer outro pai, porque te fez curtir cada pequeno passo do Antonio que possa contradizer qualquer diagnóstico médico...
Como mãe, te garanto que esse arranhão é totalmente normal... Ninguém quer ver o filho sofrer com a possibilidade de ser rejeitado pelas pessoas, de ser visto com um “ser diferente”... Se tem uma síndrome desconhecida, se é vesguinho, se tem língua presa, se tem uma perninha maior que a outra, se tem perninha torta, se fala errado... Sofremos antes que eles sofram ou até mesmo antes de que eles possam entender o que é sofrimento!
Espero, do fundo do coração, que os pais dessa criança tenham encontrado o momento certo de explicar para ela que no mundo existe preto, branco e amarelo, que existem pessoas diferentes... E para você e para a Ana desejo FORÇA para seguir essa linda jornada!!! Essa é só mais uma pedrinha na coleção... Tenho certeza que vocês vão tirar de letra!!!
Ufa... Escrevi demais... Ahhh e para contar... O Daniel nasceu no dia 27/03!!! Depois de 7 anos, estou redescobrindo as maravilhas de um novo bebê em casa!!
Beijos!
Essa semana eu vi uma entrevista com o Falcão, cantor da banda "O Rappa", em que ele disse que os integrantes da banda são completamente diferentes e que isso é essencial para a sobrevivência e sucesso deles. Comentou que o aprendizado e o ganho de cada um ali é diário devido às diferenças.
ResponderExcluirEu também penso assim hoje.
O Antonio é brutalmente diferente de mim, de você, e de todas as crianças/pessoas que esbarrarão com ele por aí, mas foi só com as diferenças nascidas com ele que eu me tornei a alma que sou hoje.
Se cada uma das pessoas que "estranham" o Antonio convivesse um pouquinho com ele...bom, acho que não preciso nem completar a frase.
Beijos da Tia Babona!!
Beta.
um carinho prá vocês.....
ResponderExcluirbem grande !
Fábio,vc é verdadeiramente PAI.
ResponderExcluirAbraços e fiquem com DEUS.
Flávia, parabéns! Que o Daniel venha cheio de saúde e preencha a casa com ainda mais alegrias. Obrigado por estas palavras. Que bom que escreveu "demais". Um bjão.
ResponderExcluirBeta, tb sou babão. Não precisa completar a frase mesmo. bjão
ResponderExcluirSolange, outro pra vc. :)
ResponderExcluirLeandro, obrigado. Fique com Deus tb. Abraço
ResponderExcluirOi Fábio! Navegando pelos mares da internet, clicando lá e cá, links e links acabei mergulhando no seu blog... Estou adorando tanta sensibilidade... Só queria te falar uma coisa... seu filho tem sorte de ter vocês como pais... ele está bem amparado - por isso tudo vai dar certo!!! Infelizmente nem todas crianças (especiais ou não, na verdade todas são especiais) tem essa condição... E vocês pais certamente se tornaram pessoas muito melhores depois da chegada do Antonio! Abraços!!!
ResponderExcluirRegina.
Regina, que bom que gostou. É uma alegria ver um texto meu ser uma agradável surpresa. Obrigado pelo comentário. Bem amparado ele está sim. E sim, nos faz melhores a cada dia. bj Espero que volte mais vezes. Toda segunda (exceto quando me atrapalho ou tenho algum imprevisto) coloco alguma coisa por aqui.
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